domingo, fevereiro 13

Para o Dia dos Namorados

GRAMÁTICA SENTIMENTAL DO CORAÇÃO

Coração - Substantivo masculino, recorte à esquerda do meu peito, a alma picotada, de luto carregado ou amores de incenso. Não, órgão oco e musculoso não. Vazio de fé, por vezes. A fazer-se forte, às tantas. Mas num intenso pulsar, sempre. Ora sepultando existências na cova funda dos anos, ora tricotando a vida que acontece enquanto penso o que fazer dela. Sensibilidade moral, sim, mas consciência da carne, quando fere. Coragem, ânimo e a forma tenrinha de te amar, a paixão sem osso, a roer-nos. Valor, carácter, saber que à boca não há-de ir para a piedade que o corpo grita. Abrir o coração, semear palavras, lavrar toda a extensão do corpo e ter a certeza de um verso na volta, a poesia em flor.
Sentimentos com lealdade para sossego dos sentidos enquanto a inquietação preenche o lugar de não estares aqui. O coração caído aos pés, estilhaços de ilusões; as utopias trituradas, o esfrangalhar do ser na lâmina, à espera de ressuscitar no campo da batalha da consciência. Falar ao coração, comovê-lo. A ver se ele se importa. Dar-lhe colo, algemar o pensamento a rascunhos de mimo e desenhar, então o essencial que os olhos não alcançam. Fazer das tripas coração, o sangue a espirrar um estoicismo que não se resigna, a fibra de um rosto de papel, a cara à luta na ventania dos dias do avesso. Ter o coração ao pé da boca, mas entalar a raiva entre o bom senso dos teus lábios. Então, dar asas às palavras que escrevo no livro de horas que cabe na tua mão. Pedir-te que a feches. Pedir-te que me guardes, coração.

Miguel Bruno Martins Carvalho
Textos de Amor: Museu Nacional da Imprensa, p.126
Quidnovi, fev. 2011

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